Se nós nada
fizermos senão de acordo com os ditames da razão, também nada evitaremos senão
de acordo com os ditames da razão. Se quiseres escutar a razão, eis o que ela te
dirá: deixa de uma vez por todas tudo quanto seduz a multidão! Deixa a riqueza,
deixa os perigos e os fardos de ser rico; deixa os prazeres, do corpo e do
espírito, que só servem para amolecer as energias; deixa a ambição que não passa
de uma coisa artificialmente empolada, inútil, inconsciente, incapaz de
reconhecer limites, tão interessada em não ter superiores como em evitar até os
iguais, sempre torturada pela inveja, e uma inveja ainda por cima dupla. Vê como
de facto é infeliz quem, objecto de inveja ele próprio, tem inveja por
outros.
Não estás a
ver essas casas dos grandes senhores, as suas portas cheias de clientes que se
atropelam na entrada? Para lá entrares, teria de sujeitar-te a inúmeras
injúrias, mas mais ainda terias de suportar se entrasses. Passa frente às
escadarias dos ricos senhores, aos seus átrios suspensos como terraços: se lá
puseres os pés será como estares à beira de uma escarpa, e de uma escarpa
prestes a ruir. Dirige ante os teus passos na via da sapiência, procura os seus
domínios cheios de tranquilidade, mas também de horizontes ilimitados. Tudo
quanto entre os homens é tomado como coisa eminente, muito embora de valor
reduzido e só notável em comparação com as coisas mais rasteiras, mesmo assim só
é acessível através de difíceis e duros atalhos. A via que conduz ao cume da
dignidade é extremamente árdua; mas se te dispuseres a trepar até estas alturas
sobre as quais a fortuna não tem poder, então poderás ver a teus pés tudo quanto
a opinião vulgar considera eminentíssimo, e desse ponto em diante o teu caminho
será plano até ao supremo bem.
Séneca
Sem comentários:
Enviar um comentário